Nos confins do sertão, com os encantadores


O cheiro de bode está impregnado no ar das redondezas da fazenda Casa dos Carneiros, onde aconteceu, no último sábado, 13, o encontro de Elomar com Chico César, Saulo Laranjeira e Xangai. “Cantadores” é o mais recente projeto do menestrel baiano, com direção musical do seu filho, o maestro João Omar. A estreia foi em casa, com convidados à vontade, improvisos e público sedento, numa noite fria e de vento forte no pé da serra da Tromba.

Tinha gente de várias partes do Brasil entre as quase duas mil pessoas que se deslocaram para o habitat natural de Elomar. Rio de Janeiro, São Paulo, Distrito Federal, Minas Gerais, Ceará, Paraíba, Pernambuco e a própria Bahia estavam bem representados. No palco, seis cadeiras aguardavam os cantadores e o maestro – mas, eles eram só cinco. Uma delas ficou vazia em homenagem ao mineiro Dércio Marques, cantador amigo de Elomar que faleceu no último mês de junho. Durante a apresentação, Elomar dedicou a ele “Incelença para um poeta morto”.

O palco do teatro Domus Operae, construído pelo próprio Elomar (que também é arquiteto) e ainda inacabado, foi ocupado por João Omar que apresentou solos de violoncelo, em seguida Xangai, depois Chico César, posteriormente Saulo Laranjeira. Os cantadores dividiam o palco em duplas e se apresentavam sozinhos a cada entrada. O mineiro Saulo Laranjeira, após cantar “O Peão na Amarração” e “Romaria” anunciou o dono da casa, que foi, inevitavelmente a grande atração e o cantador mais esperado.

“Devemos celebrar a existência do maior nome das artes brasileiras: Elomar Figueira de Mello”. Os aplausos concordaram com apresentação de Saulo e Elomar chegou ao palco para cantar e tocar “O violeiro”. A partir daquele momento, a plateia estava extasiada, era impossível encontrar alguém conversando ou com os olhos em outro lugar senão no cantador de 75 anos dedilhando a velha e companheira viola. Teve até quem percebeu que enquanto Elomar tocava, até o vento havia parado de soprar.

Com Elomar e convidados no palco, a apresentação foi uma celebração aos sertões, mas principalmente, a Elomar. Juntos, os cantadores convidados estavam ali pelo mesmo motivo que a plateia, celebrar a obra e os sertões profundos que Elomar conseguiu traduzir em melodias e letras únicas. Foi uma noite de encantamento que, quando houver nova oportunidade, aquelas mesmas pessoas estarão presentes, com certeza.

JUVENTUDE – O público que prestigiou Elomar e seus convidados naquela noite era diversificado. Tinha crianças e idosos, gente simples e sofisticada – uns de salto, outros de bota. Porém, o que chamava atenção era a quantidade de jovens que estavam ali pelo mesmo motivo dos demais: Elomar.

Há motivos para a estranheza: o último disco que Elomar gravou foi em 1995, “Cantoria 3″; Elomar não é adepto do estrelismo, não dá entrevistas, nem aparece pela mídia a fora, sequer deixa ser fotografado; é avesso às tecnologias, se pudesse nem sonorização eletrônica tinha em suas apresentações; é um crítico do sistema, da ordem, do “progresso”; é contra a cultura norte-americana e, quando fala termos inevitáveis vindo da língua inglesa, faz questão de aportuguesá-los a qualquer custo.

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